Líder da companhia que desenvolve softwares customizados para outras empresas diz que executivos ainda não sabem como aplicar a IA no dia a dia das empresas para elevar a produtividade

Presente em mais de 30 países e com cerca de 1.700 funcionários, a brasileira Radix, que atua na área de tecnologia desde 2010, pretende ampliar sua presença no exterior desenvolvendo soluções tecnológicas para diferentes indústrias.

Em entrevista ao GLOBO, João Carlos Chachamovitz, CEO da companhia de engenharia e desenvolvimento de software, diz que seu plano é, até 2028, coroar a estratégia de diversificação elevando de 30% para 50% a parcela do faturamento (que deve totalizar R$ 500 milhões neste ano) que vem de fora.

A principal demanda que ele vê surgir neste mercado é definir como introduzir a inteligência artificial (IA) na rotina das empresas. Segundo o executivo, muitos líderes sabem que a IA vai gerar aumento de produtividade, mas não exatamente como. Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

João Carlos Chachamovitz, CEO da Radix — Foto: Divulgação/Marcio Mercante

Como o senhor vê a busca das empresas por IA? Isso vem pautando o desenvolvimento de novas soluções e processos?

As empresas buscam produtividade. É isso que está em pauta. Os líderes das grandes empresas estão falando sobre o uso de inteligência artificial, mas o objetivo é aumentar a produtividade. E isso é uma combinação de pessoas, conhecimento do negócio e tecnologias.

O importante é identificar oportunidades de melhorias na operação e ver o valor que será gerado. E, se possível, quantificar isso. Não é usar a tecnologia pela tecnologia. É usá-la pelo valor que será gerado. Por exemplo, a gente vai em uma indústria e vê que o problema não é o processo e sim o fato de os dados não estarem integrados.

Mas nessa busca por produtividade, as empresas já sabem qual é o melhor caminho?

Para aumentar a eficiência, é preciso melhorar os processos. E um dos temas que ganharam muita força é a inteligência artificial, que é uma mistura de hype com mudança disruptiva. Eu realmente acredito que a inteligência artificial vai mudar a maneira como empresas e pessoas trabalham. Muitos líderes sabem que a IA vai gerar aumento de produtividade, mas eles não sabem exatamente como. Está todo mundo muito inseguro sobre como usar essas soluções.

Você usar a inteligência artificial na pessoa física é uma coisa que a gente já está vendo. Está todo mundo usando ferramentas como o ChatGPT. Mas, quando a gente fala nas empresas, é uma coisa bem mais complexa porque é preciso trabalhar com segurança e risco.

Na indústria, o uso da tecnologia da inteligência artificial será mais lento do que as pessoas estão imaginando. Todo mundo acha que no mês que vem tudo já vai estar funcionando, mas é um processo lento. Primeiro, você captura os dados, depois gera confiança com as informações e ainda precisa organizar isso para gerar uma contextualização. Depois, saber onde vai ser usado e analisar os impactos nos processos.

E nesse contexto o maior desafio é definir os casos de uso. Isso significa entender quais as entregas de valor com as aplicações que usam a IA.

Mas há dificuldade em definir o uso de IA nas empresas?

Definir os casos de uso é o desafio. Nem todos os líderes sabem quais. O CEO fala que vai investir em inteligência artificial, que isso vai aumentar a produtividade da empresa e que é um dos três temas mais importantes da agenda, mas ainda existe uma indefinição em relação a como é que isso vai ser feito.

E além disso, há outro aspecto: como isso pode ser escalado em uma empresa com 40 fábricas distintas? Esse planejamento de implementação e definição é decisivo. Envolve conhecer o processo de engenharia e automação. Um ponto importante é priorizar, pois não vai dar para fazer tudo ao mesmo tempo.

E esse investimento em IA é elevado ou os preços já estão em queda?

A inteligência artificial consome muito dados, chip, software. Esse consumo é um fator limitante na implementação das tecnologias. Nos EUA, há um data center novo a cada dois dias. E data center consome energia. Ou seja, é caro e tem a limitação da disponibilidade.

Quando a gente fala sobre definir os casos de uso tem que levar em consideração isso também. Ter essa arquitetura de infraestrutura é fundamental. Se não tiver essa etapa bem feita, é como construir um prédio maravilhoso em cima de uma base frágil. Mas o que estamos vendo é que o aumento de produtividade justifica o investimento. Dentro da Radix, o uso da IA em diversas soluções já elevou a produtividade em 20%.

Mas as empresas já estão se arriscando?

Sim. Em uma petroquímica com mais de 40 unidades, a gente está implementando toda essa jornada e, agora, estamos criando os casos de uso, desde manutenção preditiva a otimização de processo. Em uma empresa de gás nos EUA, desenvolvemos uma ferramenta usando IA para estimar o volume de emissão e o que acontece se ocorrer alguma mudança operacional.

Quando você usa IA, você consegue trazer para o operador uma ferramenta que traz um conhecimento que é como se ele tivesse um consultor experiente ao lado naquela hora de tomar uma decisão. E isso facilita muito os projetos. Mas, para cada cliente, você tem vários casos de uso.

Estamos trabalhando para pelo menos 15 empresas. Todos estão falando, mas casos práticos são muito poucos. Está todo mundo esperando. O fato de as empresas não terem ainda segurança do que realmente querem é o maior limitador no momento. Não se trata da tecnologia, mas a maneira como ela é usada.

A mão de obra é um desafio?

É necessário equipe multidisciplinar, que tenha conhecimento da tecnologia e também do negócio. E isso não é tão simples. Por isso, temos uma Academia de formação interna com treinamento e aceleração de funcionários. O desafio é formar e capacitar as pessoas em tecnologias realmente novas. E ainda há a construção de uma cultura organizacional.

A Radix faturou R$ 400 milhões no ano passado. Quais os planos para o futuro?

Nossa previsão é chegar a R$ 500 milhões em 2024 e continuar crescendo de 20% a 25% nos próximos anos. No nosso plano estratégico até 2028, vamos ter 50% do nosso negócio sendo exportado. Temos o foco nos EUA, com clientes globais.

Nossa estratégia é trabalhar em todo o ciclo do negócio. Não queremos só fazer projetos. O desafio é continuar com esse crescimento para os próximos anos.

E por que ampliar para o exterior?

A gente começou a olhar o exterior porque no começo éramos muito focados no mercado brasileiro, principalmente de energia. E, ao perceber o risco de depender só de um mercado e de uma região, vimos que um caminho natural era ir para os EUA com empresas que atuam em diversos países. Hoje, atuamos em 30 nações.

Ainda temos 60% dos negócios em energia, mas estamos ampliando para outros setores, como agro, mineração, papel e celulose, além de áreas que não são industriais. A globalização foi nosso caminho. A gente não quis se globalizar como uma empresa que consegue fornecer mão de obra barata. E eu acho que isso é uma diferença grande. A gente quis se globalizar pela nossa tecnologia.

E quais os planos de investimento para crescer?

Temos analisado opções de investimentos em empresas. Pode ser algo que aconteça no futuro com empresas ou tecnologias que complementem e acelerem as nossas soluções. Não queremos fugir do que fazemos. Temos uma estrutura de PD&I (pesquisa, desenvolvimento e inovação) na qual a gente desenvolve soluções e projetos usando verba da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e Agência Nacional do Petróleo (ANP). Esse valor está entre R$ 12 milhões e R$ 15 milhões por ano.


Fonte: O GLOBO