Atendendo a um pedido da prefeitura e do governo do estado para revitalizar o terminal internacional, Lula aceitou restringir as operações do aeroporto do Centro a voos para Congonhas e Brasília

Após meses de conversas com o governo em busca de uma solução para revitalizar o Galeão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva aceitou ontem a proposta das autoridades fluminenses de restringir operações no Santos Dumont.

Após reunião com o presidente, o prefeito Eduardo Paes informou que as únicas rotas que permanecerão no terminal localizado no Centro do Rio serão a ponte aérea para Congonhas, em São Paulo, e os voos para Brasília. Todos os demais voos para destinos domésticos serão destinados ao Galeão.

A mudança não será feita imediatamente. O próprio prefeito lembrou que, em aviação, nenhuma mudança ocorre de uma hora para outra, à medida que já existem passagens vendidas pelas companhias aéreas. Paes estima que seria viável começar o novo modelo de operação em janeiro, mas não há ainda uma decisão do governo federal a respeito da data.

Outra decisão tomada é que não será mais possível fazer check-in no Santos Dumont para voos internacionais. Embora ele não tenha rotas para o exterior, hoje o passageiro pode despachar bagagens e fazer conexões para cidades fora do país a partir do terminal localizado na região central da cidade. Isso poderá ajudar a atrair mais voos para o Galeão.

Paes se reuniu com Lula e os ministros de Portos e Aeroportos, Márcio França, e da Casa Civil, Rui Costa, no Palácio do Planalto. De acordo com relatos, o clima do encontro foi leve, apesar da urgência do Rio em encontrar uma solução para o Galeão.

— O que pedi a ele (Lula) é aquilo que a gente vinha pedindo ao governo desde o início, pedi no governo Jair Bolsonaro, mas não foi atendido. E hoje é o presidente que vai fazer. A partir daí a gente vai decidir data, mas o Aeroporto Santos Dumont passará a ser somente para ponte aérea Rio-São Paulo, ou seja, Rio-Congonhas, e Rio-Brasília. E o Aeroporto Internacional do Rio volta a receber os voos domésticos que sempre teve, o que permite que o Galeão seja um hub internacional — disse o prefeito.

A solução para enfrentar o esvaziamento do Galeão havia sido apresentada no fim de abril por Paes e pelo governador Cláudio Castro em um encontro com França. A lógica por trás dessa mudança é que a cidade precisa de um aeroporto internacional forte, capaz de atrair voos internacionais e transporte de carga.

Há meses a prefeitura e o governo do estado ressaltam, em conversas com autoridades, o peso do Galeão para a economia fluminense.

Porta de entrada do país

Inicialmente, o governo federal havia acenado com uma redução no volume de passageiros, mas agora aceitou restringir destinos. O argumento do prefeito é que, ao atrair mais voos domésticos, o Galeão passará a ter mais rotas internacionais. Isso porque o passageiro chega no Rio, que é considerado no setor de turismo como a porta de entrada do país, e pode se deslocar para outras cidades.

Segundo um técnico da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a mudança pode incrementar o volume de passageiros do Galeão, mas, por si só, ainda não é capaz de resolver a questão da administração do terminal. Desde 2014, o Galeão é operado pela concessionária RIOgaleão, controlada pela Changi, de Cingapura.

Diante do valor elevado da outorga prevista no contrato, com premissas que não foram alcançadas, e de problemas que se agravaram durante a pandemia, a concessionária decidiu devolver o aeroporto à União. Com a chegada do atual governo, porém, decidiu retomar conversas com o intuito de permanecer na gestão, desde que fossem feitas alterações no contrato.

Debate sobre concessão

Nesta semana, após reunião em Brasília, o governo começou a discutir a hipótese de uma gestão compartilhada do Santos Dumont, por meio da criação de uma sociedade de propósito específico (SPE), reunindo Infraero, prefeitura e governo do estado.

Nesta hipótese, a Changi poderia ser contratada como operadora e, na prática, administrar o fluxo dos dois terminais. Esse tema, segundo Paes, não foi abordado ontem, pois requer mais discussão para efetivamente sair do papel.

— Estou comemorando a vitória, o que vai fazer depois com a concessão, estou à disposição do governo federal para ajudar, não é uma decisão simples — afirmou. — A gestão compartilhada é um caminho, mas não é um tema relevante neste momento, pode ser um caminho para superar a dificuldade jurídica.

Desequilíbrio entre os terminais

Em 2014, o Galeão chegou a contar com 17 milhões de passageiros, mas terminou o ano passado com quase 6 milhões. Já o Santos Dumont teve fluxo de pouco mais de 10 milhões de passageiros no ano passado, um volume que deixa o terminal operando no limite.

Em nota, a RIOgaleão afirmou que a coordenação dos aeroportos do Rio e o aumento da conectividade da malha aérea permitem que a cidade volte a operar como um dos principais centros de distribuição de voos no país. “Essa condição possibilita ao Rio de Janeiro explorar e ampliar todo seu potencial turístico e econômico, contribuindo com o desenvolvimento do Brasil”, disse a empresa.

Depois do encontro, Paes comemorou a decisão no Twitter. “Restringir voos no Santos Dumont é fortalecer o Galeão. Essa é uma luta que venho travando em parceria com o governador Cláudio Castro e que hoje teve seu primeiro capítulo feliz”, escreveu o prefeito, acrescentando elogios ao presidente e aos ministros Rui Costa e Márcio França.

Em outra frente necessária para resolver a crise do Galeão, o Tribunal de Contas da União (TCU) deve autorizar, na próxima quarta-feira, o governo a renegociar com a Changi o contrato atual. O governo decidiu consultar a Corte para ter segurança jurídica.

Paes contou que vinha conversando com Lula sobre a questão do Galeão desde a campanha eleitoral, quando apoiou o então candidato do PT a presidente.

— O Rio é uma cidade que precisa de um aeroporto internacional, é a porta de entrada para o Brasil. É uma conquista excepcional, uma luta de pelo menos dois anos e meio — afirmou, citando que deixou uma proposta de portaria sobre a restrição de voos no Santos Dumont com Lula.

Para especialista, gestão única dos dois aeroportos ajudaria

Para Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria, o horizonte citado por Paes, que estima ser possível iniciar a mudança em janeiro, é factível do ponto de vista operacional. Ele cita medidas complementares, como a melhoria do acesso, e avalia que o ideal é que Galeão e Santos Dumont tenham o mesmo operador, o que ajudaria a calibrar a demanda nos dois aeroportos.

Em nota, a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) afirmou que aguarda a definição pelo Ministério de Portos e Aeroportos a respeito das mudanças e pede que a isonomia entre as empresas e seu modelo de negócios sejam respeitados.

Comemoração no Twitter

Após a reunião com Lula, Paes ainda foi às redes sociais comemorar: “Restringir voos no Santos Dumont é fortalecer o Galeão. Essa é uma luta que venho travando em parceria com o governador Cláudio Castro e que hoje teve seu primeiro capítulo feliz”, escreveu o prefeito, no Twitter, acrescentando elogios ao presidente e aos ministros Rui Costa, da Casa Civil, e Márcio França, de Portos e Aeroportos.

Decisão do TCU

A expectativa é que o Tribunal de Contas da União (TCU) autorize, na próxima quarta-feira, o governo a renegociar o contrato atual. Pela lei de criação da Anac, o mercado é livre e sendo assim, consumidores e companhias é que decidem para onde voar, cabendo ao poder concedente adequar a demanda à capacidade da infraestrutura aeroportuária.

Paes contou que vinha conversando com Lula sobre a questão do Galeão desde a campanha eleitoral, quando apoiou o então candidato do PT a presidente.

- O Rio é uma cidade que precisa de um aeroporto internacional, é a porta de entrada para o Brasil. Isso afeta não só passageiro, mas carga. Hoje o custo para o carioca é muito maior. É uma conquista excepcional, uma luta de pelo menos dois anos e meio, afirmou.

O prefeito do Rio ainda disse que deixou uma proposta de portaria redigida sobre o tema com Lula. Ele reafirmou que o Rio é muito procurado, com a maior parte dos turistas vindo para a cidade. Segundo o prefeito, como não tem voo doméstico no Galeão não tem voo internacional.

O prefeito disse ainda que a discussão sobre a concessão do Galeão tem aspectos de médio e longo prazo.

-- Quando você volta com os voos domésticos, você volta a atrair voos internacionais -- disse.

– Changi, Cingapura, SPE, são conversas que vamos travar, mas não foram discutidas hoje.

Paes também anunciou que o presidente aceitou dentro do pacote proposto hoje que não seja mais possível aos passageiros fazerem check-ins de voos internacionais no Santos Dumont.

Apesar de não ter voos diretos para o exterior, hoje o passageiro pode despachar bagagens e fazer conexões para cidades de fora do país a partir do aeroporto da região central do Rio.

— Passamos a limitar os voos internacionais do Santos Dumont. O sujeito fazer o seu check-in no Santos Dumont não vai mais ser possível.

Concessionária defende 'coordenação dos aeroportos do Rio'

Em nota, a concessionária RIOgaleão, controlada pela Changi, afirmou que "a coordenação dos aeroportos do Rio de Janeiro e o consequente aumento da conectividade da malha aérea permite que a cidade volte a operar como um dos principais hubs do país".

Para a concessionária, "essa condição possibilita ao Rio de Janeiro explorar e ampliar todo seu potencial turístico e econômico, contribuindo com o desenvolvimento do Brasil."

Para especialista, Galeão precisa de outras soluções

Para Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria, apesar da falta de detalhes sobre como a limitação de voos no Santos Dumont será colocada em prática, janeiro, como mencionado por Paes, é uma data factível do ponto de vista operacional. Seis meses seria o prazo necessário para que companhias aéreas e a própria RIOGaleão, concessionária que opera o terminal, se preparem para um aumento de voos e fluxo de passageiros no aeroporto internacional.

O problema, segundo o consultor, é que apenas limitar o Santos Dumont não resolve o problema estrutural do Galeão. Uma saída definitiva, de longo prazo, passaria por três conjuntos de medidas.

O primeiro é melhorar ao acesso ao aeroporto internacional com transporte público sobre trilhos, preferencialmente, passando pela Ilha do Fundão, onde está o campus da UFRJ.

O segundo conjunto de medidas tem a ver com o aproveitamento imobiliário do entorno. Isso inclui negócios como hotéis e galpões de distribuição para cargas que usem o transporte aéreo, com a ambição de construir um sistema aeroporto-indústria.

Por fim, segundo Frischtak, o ideal é que Galeão e Santos Dumont tenham o mesmo operador. Isso incentivaria a operadora a se engajar em investimentos estruturantes e a calibrar a demanda de cada um dos terminais.

– Na ausência dessas iniciativas estruturais, limitar o Santos Dumont não resolve o problema. Melhora? Certamente – afirmou Frischtak, destacando que um “fôlego” em termos de fluxo de passageiros para o Galeão poderia impulsionar os conjuntos de medidas.


Fonte: O GLOBO