Valentina Issler, de 24 anos, diz que oportunidade é comum no Reino Unido; curso de especialização dura sete meses

A brasileira Valentina Issler, de 24 anos, chamou a atenção da internet por acaso. Ela criou uma conta no TikTok no final de maio e, em duas semanas, os vídeos em que conta como é trabalhar no maior escritório de advocacia da Inglaterra tiveram mais de um milhão de visualizações na rede social. No entanto, um detalhe em particular gerou interesse do público: o fato dela não ter feito faculdade de direito.
 
Ela explica que isso só é possível porque, no Reino Unido, o diploma deste curso não é obrigatório para exercer a profissão. Lá, é comum ter uma formação em outra área e depois fazer a especialização em direito. Formada em Artes e Ciências pela Universidade de Londres, ela diz que o ensino britânico incentiva a união de matérias consideradas “opostas” antes do estudante definir uma especialidade.

— Conheço executivos que são formados em japonês. As faculdades na Inglaterra, em geral, dão uma ênfase às habilidades pessoais. Como você interage com pessoas, como fala com os clientes. Eles pensam que para saber as leis, por exemplo, é só consultar um livro de direito. [Mas], com essas outras características, não é assim — disse Valentina.

Entenda como funciona:
  • Na Inglaterra, é possível se formar em qualquer área e ainda assim seguir uma carreira como advogado. Para isso, até pouco tempo atrás, era preciso fazer um “curso de conversão ao direito”, que costumava durar sete meses;
  • Em seguida, o estudante deve fazer uma prova (algo semelhante à OAB no Brasil). Além disso, o candidato também precisa passar por dois anos trabalhando como aprendiz em um escritório;
  • Agora, de acordo com Valentina, o curso de conversão não é mais necessário. O estudante que deseja seguir a carreira como advogado deve realizar duas provas. O processo é o mesmo para brasileiros que queiram seguir a carreira na Inglaterra, ainda que tenham estudado direito no Brasil;
  • O tempo obrigatório como aprendiz, no entanto, permanece o mesmo: dois anos até poder ser considerado um advogado.
Ainda segundo Valentina, o curso de conversão ao direito custa, em média, 16 mil libras (R$ 98 mil). Já as duas provas obrigatórias exigidas atualmente, chamadas SQE1 e SQE2, custam, respectivamente, 1,5 mil e 2,4 mil libras (R$ 9,5 mil e R$ 14,8 mil). Apesar dos valores elevados, ela conta que as maiores empresas de advocacia do país têm programas em que pagam os cursos para o estudante.

— Depois de formada, você trabalha dois anos com eles. Nesses casos, são tipo quatro mil candidatos para 40 bolsas — explicou ela, detalhando que as provas cobram informações específicas da área, mas que é possível estudar as leis sozinhos, se o estudante assim preferir. — [Já quem faz] direito no Reino Unido faz apenas uma das provas antes de começar a trabalhar — concluiu, afirmando que a avaliação é feita online.

A vida em Londres

Nascida em São Paulo, Valentina se mudou para Madri, na Espanha, quando tinha 8 anos. Levada à Europa pelo trabalho da mãe, ela conta que, nos primeiros anos, sofria bullying por ser brasileira — algo que melhorou quando ela entrou em uma nova escola, desta vez britânica, em que havia alunos de vários lugares do mundo. Tempos mais tarde, já na faculdade, decidiu estudar Engenharia e Cinema em Londres.

— Eu me formei em 2019 na Universidade de Londres, e por lá eles disponibilizam muitas matérias interdisciplinares, em que misturam física e música, ciência e religião. É um curso maravilhoso, mas a questão é que, quando me formei, fiquei muito perdida. Eu gostava muito de números, mas também adorava arte e cinema — afirmou.

Na época, ela chegou a pensar em fazer mestrado em Cinema, mas, antes de começar o curso, trabalhou em uma startup. Segundo a brasileira, no local as pessoas “faziam de tudo um pouco” e, quando estava no setor de marketing, descobriu que aquilo a “irritava de um jeito” que não consegue explicar. Foi quando ela entendeu que não conseguiria trabalhar na área — e passou a considerar o direito como possibilidade.

— Fiquei feliz e aliviada. [Apliquei para uma empresa, passei e] eles pagaram pelo meu curso, minha prova e também bancaram meu aluguel durante os estudos. Agora estou há seis meses trabalhando e, depois do contrato, posso escolher livremente o que quero fazer, inclusive se preferir sair da empresa.


Fonte: O GLOBO