Um menino caminha por uma estrada escavada após uma operação militar israelense no campo de al-Far'a para refugiados perto de Tubas, no norte da Cisjordânia — Foto: ZAIN JAAFAR/AFP
Porto Velho, Rondônia - A Organização das Nações Unidas (ONU) expressou preocupação com as operações israelenses na Cisjordânia, que seguem pelo segundo dia consecutivo nesta quinta-feira com ao menos 14 mortos, cinco a mais do que os nove divulgados na véspera pelo Exército israelense. O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou que as incursões "alimentam" uma situação já explosiva no território ocupado, pedindo sua "interrupção imediata". Segundo o Exército de Israel, entre os cinco mortos desta quinta está um comandante da Jihad Islâmica, informação confirmada pelo grupo armado.
“Esses desenvolvimentos perigosos estão alimentando uma situação já explosiva na Cisjordânia ocupada e minando ainda mais a Autoridade Palestina”, disse em um comunicado, lamentando também "a perda de vidas, inclusive de crianças".
Israel iniciou incursões coordenadas na madrugada de quarta-feira contra as cidades de Jenin, Tubas e Tulkarem, no norte da Cisjordânia, e uma missão separada em Nablus, segundo o jornal israelense Haaretz, que os militares chamaram de operação de "antiterrorismo". Acredita-se que as incursões sejam a primeira vez desde a Segunda Intifada — levante palestino de 2000 a 2005 — em que várias cidades palestinas foram alvos simultâneos.
Colunas de veículos blindados israelenses apoiadas por tropas e aviões de guerra foram enviadas antes de os soldados cercarem os campos de refugiados nestas cidades e trocarem tiros com combatentes palestinos. Testemunhas disseram que as forças israelenses haviam se retirado do campo de refugiados de Al-Far'a, nos arredores da cidade de Nablus, onde vários palestinos foram mortos na quarta-feira. O Clube dos Prisioneiros Palestinos disse que pelo menos 45 pessoas foram presas desde o início da operação israelense no norte da Cisjordânia.
Pessoas inspecionam danos a uma mesquita após uma operação militar israelense no campo de Fara para refugiados palestinos perto de Tubas, no norte da Cisjordânia ocupada — Foto: ZAIN JAAFAR/AFP
Um fotógrafo da AFP disse que os confrontos ainda estavam ocorrendo em Jenin, onde um drone foi visto sobrevoando o local. Outro jornalista da agência francesa disse que os soldados israelenses também continuavam operando em Tulkarem. A violência causou destruição significativa, especialmente em Tulkarem, cujo governador descreveu os ataques como "sem precedentes" e um "sinal perigoso". Imagens da AFPTV mostraram escavadeiras arrancando o asfalto das ruas da cidade como precaução contra explosivos escondidos. As autoridades relataram danos generalizados à infraestrutura, inclusive às redes de água e esgoto.
O exército disse que matou cinco combatentes nessa cidade durante essas últimas operações. Mas o número do total de mortos (14, pelo exército) diverge quando somadas a atualização das forças armadas com o balanço divulgado por outras fontes: a Cruz Vermelha fechou a quarta-feira com dez mortos na operação da Cisjordânia, o que elevaria o total para 15, enquanto o Ministério da Saúde palestino fala em 12 pessoas mortas no primeiro dia da operação, o que elevaria o total para 17 (número usado pela agência de notícias Wafa).
Comandante da Jihad Islâmica é morto
Em comunicado, os militares israelenses disseram que, "após troca de tiros, as forças eliminaram cinco terroristas que haviam se escondido dentro de uma mesquita” em Tulkarem, incluindo o comandante da filial da Jihad Islâmica no campo de refugiados de Nur Shams, Muhammad Jabber. O Exército de Israel o acusa de "envolvimento em vários ataques terroristas e de ter ordenado um tiroteio em junho que matou um civil israelense". O grupo confirmou a morte de Jabber, também conhecido amplamente por seu nome de guerra Abu Shujaa, que significa Pai dos Bravos.
"Abu Shuyaa, comandante em Tulkarem das brigadas de al-Quds [braço armado da Jihad Islâmica] morreu ao lado de vários irmãos de sua brigada após uma batalha heroica contra os soldados" israelenses, anunciou o grupo, que tem forte presença nos campos de refugiados da Cisjordânia, em um comunicado. A Jihad Islâmica disse ainda que o comandante "havia escapado de outras tentativas de assassinato e detenção" por parte das tropas israelense.
Muhammad Jabber, também conhecido como Abu Shujaa, comandante do campo de refugiados de Nur Shams das Brigadas al-Quds em Tulkarem — Foto: SALEH HAMAD/AFP
Mais de 13 mil palestinos estão aglomerados em 20% de um quilômetro quadrado do campo de refugiados de Nur Shams, inaugurado em 1952 para receber palestinos que fugiram ou foram forçados a fugir das cidades próximas de Haifa, na costa, após a criação do Estado de Israel em 1948. Segundo a ONU, que administra o local, este é um dos 19 campos de refugiados na Cisjordânia mais afetados por problemas de saúde. A proximidade de um canal de drenagem de esgoto expõe a população a inundações, o que aumenta os riscos de doenças.
As incursões israelenses na Cisjordânia aumentaram desde o início da guerra em Gaza, iniciada em outubro após o ataque terrorista do Hamas ao sul de Israel, que deixou 1,2 mil mortos e fez 251 reféns, 103 das quais ainda estão em cativeiro no enclave, incluindo 33 que o Exército israelense diz estarem mortas.
Cidades como Tulkarem têm sido focos de militância por anos, bem antes do conflito no enclave, mas a intensificação da repressão por tropas militares ou colonos israelenses — que segundo a ONU, já matou 637 palestinos — parecem estar surtindo o efeito contrário, estimulando uma nova geração de combatentes e adeptos às facções palestinas. Jaber, ao ser entrevistado pelo jornal New York Times em julho deste ano, ao ser questionado sobre que lição tirou da guerra em Gaza, afirmou:
— Paciência. E força. E coragem.
Do outro lado, 19 israelenses, incluindo soldados, foram mortos em ataques palestinos ou durante operações do exército, de acordo com dados oficiais israelenses.
Carro de agência da ONU é alvejado em Gaza
A violência também tem se alastrado em Gaza, onde o Exército israelense disse na quinta-feira ter "eliminado dezenas" de militantes durante o último dia em combates a curta distância e ataques aéreos. As forças armadas disseram que um dos mortos na área de Khan Yunis, no sul de Gaza, era um militante que participou do ataque de 7 de outubro.
A campanha militar de retaliação de Israel ao ataque do Hamas matou pelo menos 40.602 pessoas em Gaza, de acordo com o Ministério da Saúde do território administrado pelo Hamas desde 2007. O escritório de direitos humanos da ONU afirma que a maioria dos mortos são mulheres e crianças.
"É simplesmente catastrófico”, disse Louise Wateridge, porta-voz da agência da ONU para Refugiados palestinos no Oriente Médio (UNRWA) no X. “O que estamos vendo agora são famílias, mães e crianças arrastando seus pertences. Há um acesso muito limitado a qualquer tipo de veículo para esse tipo de deslocamento agora, e as pessoas simplesmente não sabem para onde ir."
Além da assimetria no número de mortos, que provocou uma pressão da comunidade internacional, incluindo aliados, sobre Israel para que resguardasse a vida de civis, a guerra devastou a infraestrutura de Gaza e provocou uma crise humanitária. A ONU afirmou que continuava a prestar assistência humanitária, apesar do transtorno causado aos civis e às equipes de ajuda pelas repetidas ordens de deslocamento e operações militares israelenses.
Mas, o Programa Mundial de Alimentos (WFP, na sigla em inglês) da organização informou na quarta-feira que estava congelando sua movimentação de funcionários no enclave após uim de seus veículos terem sido alvo de vários tiros a poucos metros de um posto de controle israelense.
"Apesar de estar claramente marcado e receber várias autorizações das autoridades israelenses para se aproximar, o veículo foi atingido diretamente por tiros enquanto se movia em direção a um posto de controle das Forças Armadas de Israel", disse a agência em comunicado. Pelo menos 10 balas atingiram o veículo, informou o WFP, mas nenhum funcionário sofreu ferimentos físicos.
Em uma publicação no X nesta quinta, o programa disse que "as operações continuam apesar dos imensos desafios, dos crescentes riscos de segurança e dos repetidos riscos de deslocamento."
O Exército israelense disse que o caso está sob revisão.
Fonte: O GLOBO
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