O Palácio do Planalto sinalizou que vai manter distância da eleição para a presidência da Câmara, que já movimenta deputados, e há ainda negociações para destravar o repasse de recursos do Ministério da Saúde

Na tentativa de amenizar o momento turbulento com o Congresso, impulsionado pelo veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a R$ 5,6 bilhões em emendas de comissão, o governo prepara uma série de acenos aos parlamentares. 

O principal deles é instituir um calendário para o pagamento das verbas indicadas por congressistas, demanda antiga do Parlamento. O Palácio do Planalto também sinalizou que vai manter distância da eleição para a presidência da Câmara, que já movimenta deputados, e há ainda negociações para destravar o repasse de recursos do Ministério da Saúde.

Os movimentos ocorrem em um início de ano em que, mal os trabalhos do Legislativo recomeçaram, a pressão sobre o Executivo subiu de tom. Na sessão de volta do Congresso, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), fez um discurso repleto de recados diretos. 

Ele afirmou que o Orçamento “pertence a todos”, não só ao Executivo, e cobrou o cumprimento de acordos — mensagem direcionada ao ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais), com quem está rompido. O acirramento da tensão levou a um encontro com Lula, em que combinaram que o jogo, de agora em diante, “está zerado”, segundo disseram interlocutores de ambos.

Recuo sob pressão

Nesta toada, o governo planeja a apresentação de um cronograma para a liberação de emendas com programações de empenho até julho, mês limite para o desembolso de verbas aos municípios antes das eleições municipais de outubro. A ideia é que o calendário do Planalto substitua aquele elaborado pelos deputados e incluído na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), mas vetado por Lula.

A negociação vem na sequência de outra trava que irritou parlamentares: as emendas de comissão, aprovadas pelo Congresso com o montante de R$ 16,6 bilhões, foram reduzidas a R$ 11 bilhões. Como O GLOBO mostrou, esse instrumento tem sido usado para repassar recursos a bases eleitorais sem transparência sobre o verdadeiro responsável. Por trás das aprovações e vetos, está a disputa entre Executivo e Legislativo em torno do controle do Orçamento.

— Vai ser um calendário exequível, melhor do que havia sido proposto. Os parlamentares compreendem que é impossível o Parlamento determinar a execução. Não é realista — disse o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), segundo o qual as tratativas estavam em andamento antes mesmo da crise mais recente.

Crescimento das emendas de comissão — Foto: Arte O Globo

Para parlamentares da base, a previsibilidade nos repasses pode ajudar a acalmar os ânimos.

— Vamos apresentar esse cronograma como um compromisso oficial do governo. O formato do documento ainda será definido — disse o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), que coordenou a atuação do governo no Congresso nas discussões sobre a Lei Orçamentária Anual (LOA).

Em outro gesto, Lula afirmou a Lira que não vai interferir na sucessão do comando da Casa, em fevereiro de 2025. Segundo interlocutores, o presidente acrescentou que o governo não vai atuar contra o candidato apoiado pelo deputado — hoje, o mais cotado é Elmar Nascimento (União-BA), nome que alas do Planalto veem com ressalvas. Lira deseja ser o condutor do processo e, na conversa, ambos concordaram que ainda é cedo para iniciar os debates.

De acordo com articuladores do governo, a única hipótese de o Planalto trabalhar para interferir na eleição seria se houvesse chance de um candidato bolsonarista se viabilizar na corrida, cenário hoje distante. 

Lula também não quer repetir o que avalia como um erro do governo Dilma Rousseff, quando o PT lançou, em 2015, o deputado Arlindo Chinaglia (SP) para enfrentar Eduardo Cunha, então no MDB, na Câmara. Eleito presidente da Casa, Cunha se tornou o principal algoz da petista, contra quem abriu o processo que levou ao impeachment. Na reunião, Lira também acertou que terá um canal mais direto com Lula de agora em diante.

Da conversa, saiu ainda um esboço de acerto em outro tema que vinha incomodando o Congresso: o represamento de recursos no Ministério da Saúde. Lira e outros parlamentares chegaram a apresentar um requerimento direcionado à ministra Nísia Trindade pedindo explicações sobre critérios para o direcionamento de verbas. Houve o pedido de Lira para um encontro entre técnicos do Congresso e do Planalto para que fosse possível chegar a uma conclusão sobre o assunto.

Ao longo da semana passada, governistas afirmaram que mais de R$ 2 bilhões em emendas alocadas na Saúde começaram a ser pagas. De acordo com congressistas, o acordo era que o valor fosse alcançado ainda no ano passado, mas o montante parou em cerca de R$ 300 milhões. 

Uma portaria publicada pelo Ministério da Saúde vai possibilitar ainda que estados e municípios sejam abastecidos com outra fonte de recursos: R$ 17 bilhões que não foram usados durante a pandemia de Covid-19. Ainda que a pasta ressalte que faz destinações baseadas em critérios técnicos, a ação nas bases eleitorais em uma área sensível, em ano de eleição municipal, poderá funcionar como um agrado aos parlamentares das regiões beneficiadas.

Vetos presidenciais

Na conversa para aparar arestas, Lira pediu a Lula também uma sinalização de que haverá mais atenção aos vetos presidenciais, principalmente em projetos que passaram por longa discussão no Congresso e envolveram acordos, inclusive, com a base governista. 

O projeto de lei sobre os agrotóxicos, por exemplo, foi aprovado com um texto relatado pelo líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (PT-ES), após tramitar por mais de 20 anos. Os vetos feitos por Lula ao projeto, bandeira da bancada ruralista, causaram forte irritação entre os parlamentares.

No Palácio do Planalto, a intenção é atender às demandas dos parlamentares para conseguir avançar na pauta econômica o máximo possível até junho, já que as eleições municipais devem impor outro ritmo ao Congresso no segundo semestre. Mesmo com uma ampla aliança, o governo não tem uma base sólida para aprovar todas as pautas que deseja e terá que negociar, projeto a projeto, como fez ano passado.

BOA VIZINHANÇA

Governo prepara uma série de acenos ao Congresso

Calendário para pagamento de emendas

O governo planeja a apresentação de um cronograma para a liberação de emendas com programações de empenho até julho

Insatisfação: Esse prazo substituiria o que foi incluído na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) pelos parlamentares, mas vetado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Outro motivo de irritação foi o veto de Lula a R$ 5,6 bi de emendas de comissão. Esse instrumento tem sido usado para repassar recursos a bases eleitorais sem transparência sobre o verdadeiro responsável.

Destravar recursos da Saúde

Ao longo da semana passada, governistas afirmaram que mais de R$ 2 bilhões em emendas alocadas na Saúde começaram a ser pagas.

Uma portaria publicada pelo Ministério da Saúde vai possibilitar ainda que estados e municípios sejam abastecidos com outra fonte de recursos: R$ 17 bilhões que não foram usados durante a pandemia de Covid-19.

Insatisfação: O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e outros parlamentares chegaram a apresentar um requerimento direcionado à ministra Nísia Trindade pedindo explicações sobre critérios para o direcionamento de verbas.

Eleição para a presidência da Câmara

Lula afirmou a Lira que não vai interferir na sucessão do comando da Casa, em fevereiro de 2025.

Insatisfação: Alas do Palácio do Planalto veem com ressalvas o líder do União Brasil, deputado Elmar Nascimento (BA), hoje o mais cotado para disputar com o apoio de Lira.


Fonte: O GLOBO