É preciso pensar novas formas de acesso ao Fundo e de incentivo à compra da casa própria, mas sem criar novas vulnerabilidades para o cidadão

A nova modalidade de uso do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) que deve ser lançada pelo governo em março, o FGTS Futuro, preocupa. Ela usa parte das contribuições o trabalhador ainda vai receber dessa "poupança". 

A Caixa desconta do que o trabalhador recebe a cada mês e paga diretamente ao banco credor. O problema é que o risco de perder o emprego é uma realidade para qualquer trabalhador e trabalhadora do setor privado. A pessoa perderá o emprego e terá um aumento do custo com o pagamento da casa própria.

Na prática, a nova regra possibilita que o trabalhador se comprometa com uma prestação maior do que a sua real capacidade de pagamento. Pela lei, o comprometimento da renda com o financiamento da casa própria sobe de 25% para 30% , considerando que parte será pago diretamente pelo Fundo ao banco onde foi contratado o financiamento.

Essa ideia surgiu no governo Bolsonaro, num momento em que a equipe econômica estava completamente envolvida nas eleições, em fazer o máximo para aumentar a popularidade do ex-presidente. Foi nesse período que aprovaram o aumento de gastos e de operações arriscadas como o consignado dentro do Auxílio Brasil, por exemplo, que deu muito errado. Na época, eu alertei que essa modalidade de FGTS era um risco, não mudei de ideia desde então.

A princípio a nova modalidade será voltada a beneficiários do Minha Casa, Minha Vida, com o foco em famílias com renda mensal de até R$ 2.640, que são as que compõem a Faixa 1 do programa habitacional do governo. Nessa faixa já há subsídio, o que está correto, pois é voltado aos mais pobres. A prestação, nessas operações, responde por uma parte do custo total do imóvel. A questão é que se o cidadão não conseguir pagar a mensalidade ele perde a casa, e com ela perde toda a sua poupança, todo esforço econômico que a família fez.

Por isso, é importante pensar melhor sobre essa regra. Por exemplo, quem vai ter que arcar com a inadimplência caso ela venha acontecer, é o governo?

Ainda há uma outra questão, nessa faixa de renda a maioria dos brasileiros está no mercado informal. Isso quer dizer que essa é uma política pública que beneficia apenas uma parcela da população, a que tem carteira assinada. É preciso, sim, pensar em outras formas de subsídio e incentivo para que os mais pobres comprem a casa própria.

O FGTS é uma poupança do trabalhador à qual ele tem pouco acesso. Acho que aumentar o acesso é bom para evitar que o poupador seja tutelado. Mas neste caso vai ao oposto, já que compromete o que ele nem recebeu ainda.


Fonte: O GLOBO