O procurador-geral da República, Paulo Gonet, deve enfrentar resistência no Supremo Tribunal Federal (STF) em sua tentativa de derrubar a decisão do ministro Dias Toffoli que suspendeu a multa de R$ 10,3 bilhões firmada pela J&F em um acordo de leniência. O acordo foi fechado pelo grupo dos irmãos Joesley e Wesley Batista com o Ministério Público Federal (MPF) no âmbito da Operação Greenfield, em 2017.
Conforme antecipou O GLOBO, Gonet informou a interlocutores que vai recorrer da decisão liminar de Toffoli. A mulher do ministro, Roberta Rangel, é advogada da J&F. Ela atua pela empresa no litígio contra a indonésia Paper Excellence em torno da aquisição da Eldorado Celulose, inclusive assinando petições.
Como é nada provável que Toffoli recue do próprio entendimento, Gonet tem basicamente duas opções: entrar com um pedido de suspensão da liminar direcionado ao próprio presidente do STF, Luís Roberto Barroso, ou apresentar um recurso para que a decisão seja analisada pela Segunda Turma do STF, colegiado formado por Toffoli, Gilmar Mendes, Kassio Nunes Marques, André Mendonça e Edson Fachin.
Só que, nas contas de investigadores e fontes que acompanham de perto o caso, se o recurso parar na Segunda Turma, as chances de êxito da PGR são remotas. Isso porque Gilmar deve se aliar a Toffoli, enquanto Mendonça – defensor dos acordos de leniência – ficaria ao lado do relator da Lava-Jato, Edson Fachin, pela manutenção do valor bilionário da multa da J&F.
A peça-chave desse eventual julgamento seria, então, o ministro Kassio Nunes Marques, que já acompanhou outras vezes Gilmar Mendes para impor reveses à Lava-Jato, como no julgamento em que foi arquivada uma denúncia contra o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), por envolvimento em desvios na Petrobras.
Na condição de relator do caso, cabe a Toffoli decidir quando o caso deve ser liberado para julgamento e analisado pelos colegas. “Na Segunda Turma, é impossível o Gonet ganhar. E, se o Toffoli achar que tem condições de a liminar cair, ele não pauta”, disse à equipe da coluna um integrante do Ministério Público Federal (MPF) que acompanha o caso de perto.
É por conta dessas dificuldades que a PGR avalia uma alternativa – entrar com uma suspensão de liminar, para Barroso decidir em pleno recesso, ou encaminhar o caso para a análise do plenário do Supremo. Lá, votam o presidente do STF, os ministros da Segunda Turma e os integrantes da Primeira Turma – Luiz Fux, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.
Em tese, no plenário haveria mais chances de derrubar a decisão de Toffoli que na Segunda Turma.
Um dos pontos que Gonet deve apontar é que o valor da multa de R$ 10,3 bilhões imposto a J&F foi contestado em uma ação que originalmente nada tem a ver com a empresa.
O processo foi movido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para garantir acesso a dados do acordo de leniência da Odebrecht e aos arquivos da Operação Spoofing, que investiga a invasão de celulares de autoridades como o ex-juiz e atual senador Sergio Moro (União Brasil-PR) e o ex-coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol.
A ação já teve mais de 60 pedidos de extensão e acabou tendo o escopo ampliado, o que levou a J&F – que firmou um acordo de leniência com o Ministério Público Federal fora do âmbito da Lava-Jato – a pedir a suspensão das multas do acordo de leniência até a análise de todo o material colhido na Spoofing.
Apesar dos empecilhos para Gonet reverter o entendimento de Toffoli, procuradores ouvidos pela equipe da coluna avaliam que o recurso é importante para marcar posição em defesa do Ministério Público Federal (MPF) – e tentar impor limites à ação movida por Lula.
Antes de acionar Toffoli, o grupo dos irmãos Batista havia conseguido que o subprocurador Ronaldo Albo fizesse uma série de manobras dentro da PGR para tentar garantir um desconto bilionário no valor da multa, o que foi acompanhado com apreensão por Gonet e abriu uma crise dentro do Ministério Público Federal.
Após o desconto na multa de R$ 6,8 bilhões, revelado pela equipe da coluna, ser derrubado pelo Conselho Institucional do MPF, a J&F decidiu acionar o Supremo por meio de um “atalho jurídico” na ação movida por Lula. Na prática, o grupo decidiu apostar no Supremo para resolver a questão, ao invés da PGR, onde a repactuação do valor a ser pago acabou barrada – e irritou subprocuradores que condenaram as manobras de Albo, alvo de um inquérito disciplinar.
Depois que a J&F conseguiu de Toffoli a suspensão do pagamento das multas previstas no acordo, a Odebrecht decidiu “pegar carona” no pedido do grupo dos irmãos Joesley e Wesley Batista para conseguir o mesmo resultado,
conforme mostrou o blog.
Fonte: O GLOBO
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