Em “The Death of Public School: How Conservatives Won the War Over Education in America”, a jornalista Cara Fitzpatrick detalha impactos da atuação de movimentos que questionam o modelo tradicional de escola gratuita, laica e de gestão estatal

Saiu nos Estados Unidos um livro que retrata um movimento semelhante ao que vivenciamos no Brasil. Em “The Death of Public School: How Conservatives Won the War Over Education in America” (“A morte da escola pública: como conservadores venceram a guerra sobre educação nos Estados Unidos”), a jornalista Cara Fitzpatrick detalha raízes históricas, estratégias e impactos da atuação de movimentos que questionam o modelo tradicional de escola gratuita, laica e de gestão estatal.

O livro destaca três grandes grupos. Um deles é o de religiosos que entendem ser papel do Estado viabilizar escolhas baseadas em crenças individuais. Aqui entra tanto a defesa do home schooling quanto do financiamento público de escolas religiosas, por meio de vouchers enviados às famílias ou via transferência direta de recursos estatais para instituições confessionais.

Um segundo grupo que, historicamente, teve forte atuação contra o modelo tradicional de escola pública foi o de segregacionistas brancos insatisfeitos com uma decisão de 1954 de Suprema Corte (conhecida como o caso “Brown versus Board of Education”), que proibiu redes estatais de separar alunos negros e brancos. Para esse grupo, a possibilidade de usar dinheiro de impostos em instituições privadas possibilitaria continuar mantendo seus filhos em instituições restritas — mesmo que por critérios não explícitos — aos negros.

Por fim, o terceiro grupo em destaque é o de liberais (no sentido econômico do termo), defensores da ideia de que a livre concorrência entre escolas elevaria a qualidade de todo o sistema educacional. O principal idealizador deste movimento foi o economista Milton Friedman (1912-2006), autor de vários artigos em defesa de um sistema universal de vouchers, em que cada família recebesse do Estado uma quantia que permitisse, por sua livre iniciativa, escolher uma escola particular.

O livro mostra que, mesmo nem sempre concordando com as motivações de cada grupo, esses movimentos se uniram em diversos momentos para fazer lobby por leis e decisões judiciais ou do Executivo. O modelo que mais prosperou no contexto americano foi o de charter schools gratuitas (administradas por grupos privados, mas mantidas com recursos estatais). 

Ainda que sejam os conservadores seus principais defensores, em alguns estados elas foram apoiadas também por políticos democratas ou por comunidades negras insatisfeitas com a qualidade do ensino público em seus bairros.

Nos últimos anos, porém, o apoio ao sistema público tradicional ou à possibilidade de escolha individual financiada pelo Estado virou mais um tema a dividir a sociedade americana. Neste contexto, o mais comum é favoráveis ou críticos selecionarem apenas as evidências que confirmam suas visões prévias. Como mostra Fitzpatrick em seu livro, há estudos mostrando impactos positivos de escolas ou redes que adotaram em alguma medida o modelo. 

Mas há também estados em que o resultado foi amplamente negativo, ou mesmo casos de escolas privadas denunciadas por fraudes e abusos. Diante desse conjunto de evidências mistas, o máximo que pode ser dito é que, até o momento, o financiamento estatal de instituições privadas não foi a panaceia apregoada por muitos de seus defensores.

Ao fim, porém, o debate não é apenas sobre qual modelo traz melhores resultados, mas também, e fundamentalmente, sobre visões a respeito dos princípios e objetivos da educação pública.


Fonte: O GLOBO