Decisão do Supremo, por nove votos a dois, evita um novo genocídio dos povos originários

Venceram os indígenas e venceu o Brasil com a decisão de ontem do STF, que por nove votos a dois votou contra a tese jurídica do marco temporal na demarcação dos territórios ocupados pelos povos originários.

Venceu a Constituição brasileira, que diz o seguinte: os indígenas têm direito às terras que tradicionalmente ocupam.

Isso não quer dizer que qualquer grupo indígena possa requerer qualquer terra. Uma demarcação leva muito tempo: são necessários laudos antropológicos e anos de estudo. Portanto, não há esse risco.

Já o risco de se reconhecer a tese do marco temporal seria muito grande. Estimularia ainda mais a grilagem dessas terras, que são as mais desejadas porque são as mais preservadas, e isso pode ser verificado em qualquer mapa de imagem de satélite que se olhe. Possuem mais floresta, mais água, mais madeira.

Ainda haveria o risco de contato forçado com povos indígenas isolados, um perigo cultural muito sério.

A decisão foi o reconhecimento do que queria o relator do artigo 231 da Constituição. Aliás o relator desse artigo era o senador Jarbas Passarinho, que estava longe de ser progressista, pelo contrário, foi ministro da ditadura e era coronel.

Essa data do marco temporal, de 5 de outubro de 1988, foi uma invenção do movimento ruralista pegando um trecho do voto do ministro Ayres Britto em um caso específico da terra indígena Raposa Serra do Sol.

O assunto continua em pauta, por dois motivos.

O primeiro é que na próxima quarta o Supremo decide se haverá ou não indenização de quem ocupa terras indígenas, ou seja, aqueles que adquiriram essas áreas de boa-fé - fazendo a ressalva que, na Amazônia, são poucos.

Além disso há um projeto de lei no Senado, defendido por ruralistas, estabelecendo o marco temporal. Mas com o entendimento do STF é difícil que vá adiante.

De qualquer forma, ontem foi um dia histórico, em que se afastou essa ameaça para o meio ambiente, povos indígenas e o próprio país. A aprovação do marco temporal seria um novo genocídio indígena.


Fonte: O GLOBO