Valor é a média que cada conselheiro da metalúrgica recebe. Ministros foram escolhidos pelo BNDES para colegiado da empresa, o que acende alerta para nomeações políticas

A metalúrgica Tupy anunciou na última sexta-feira que os ministros Carlos Lupi, titular da pasta de Previdência Social, e Anielle Franco, da Igualdade Racial, são os novos membros de seu Conselho de Administração. A companhia, que faturou no ano passado R$ 10,2 bilhões, informou que as indicações foram feitas pela BNDESPar, braço de investimento do BNDES, dono de 28,19% das ações da companhia.

A mudança no conselho reforça a atuação do governo, que tenta emplacar nomes nas empresas por meio da BNDESPar e de fundos de pensão como Previ (Banco do Brasil) e Petros (Petrobras).

As nomeações de Lupi e Anielle ocorrem após a renúncia de conselheiros indicados anteriormente pela BNDESPar: Carla Gaspar Primavera e Fabio Rego Ribeiro. O mercado reagiu mal. Na segunda-feira, os papéis fecharam em baixa de 1,92%, a R$ 25,99. Ontem, porém, voltaram a subir.

Um analista de mercado, que não quis se identificar, criticou as indicações, já que os ministros não têm atuação relacionada ao setor da empresa. E citou que é preciso cautela com indicações políticas.

Fundada há mais de 80 anos, a Tupy tem fábricas em Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais, além de México e Portugal. Conta com 19 mil funcionários e produz componentes como blocos de motores para automóveis e tratores, além de peças industriais.

Remuneração de R$ 36,1 mil por mês

O salário de um membro do Conselho de Administração da Tupy é de R$ 36,1 mil por mês, considerando a remuneração anual de R$ 433,4 mil, na média de cada conselheiro, dividida em 12 meses.

No caso da Tupy, quando se soma a remuneração com “salário ou pró-labore” com a remuneração por participação em comitês e com base em ações, a média anual de cada conselheiro fica em R$ 634,9 mil. Em 12 meses, são R$ 52,9 mil mensais.

Segundo fontes, a indicação para o colegiado da Tupy não é caso isolado. O governo estaria tentando emplacar nomes em empresas como Eletrobras, Vale, Cemig e JBS. A avaliação é que a composição atual é muito “pró-mercado”, e o que se busca é ampliar a presença de integrantes mais alinhados ao atual governo.

A política interna do BNDES para preenchimento de cargos em conselhos foi alterada em abril, em uma guinada promovida pela atual gestão do banco. Assim, funcionários do banco passaram a ser indicados para os colegiados de empresas nas quais a BNDESPar tem ações, prática que já foi adotada em outros governos do PT.

A nova política traz uma série de critérios e diz que “sempre que possível” deve ser mantida a paridade, no conjunto de indicados, entre “mulheres e membros de comunidades minorizadas e os demais indicados”.

O regulamento prevê que os indicados devem ter “notório conhecimento e formação acadêmica compatíveis com o cargo”.

Não podem ser indicadas pessoas que sejam “dirigente estatutário de partido político”. Lupi, no entanto, é presidente da Executiva Nacional do PDT.

Ação para desqualificar

A ministra Anielle afirmou em nota que “é comum a tentativa de desqualificação das mulheres em geral, mas principalmente de mulheres negras, especialmente nas situações de acesso ao poder, ou em caso de remuneração, por seu trabalho, suas qualificações e sua capacitação”.

E acrescenta que isso ocorreu na indicação ao cargo de ministra e agora na nomeação ao conselho da Tupy. Ela reforça ainda que o país precisa “da presença de mais mulheres negras e mais pessoas negras nos espaços de decisão”.

Procurado, o ministro Carlos Lupi não respondeu até o fechamento desta edição.

Em nota, a Tupy afirmou que é a maior contribuinte da balança comercial brasileira de autopeças e diz que desde a década de 1990 tem BNDESPar e Previ como acionistas, “que acreditam e estimulam seu crescimento e internacionalização”. Acrescenta que sua governança é sustentada em fundamentos sólidos.

Em nota, o BNDES afirma que a indicação de lideranças dos setores público e privado para conselhos de empresas nas quais a BNDESPar investe é um movimento natural, que busca levar essa experiência a instâncias estratégicas dessas empresas.

A BNDESPar tem direito de indicar membros para 34 vagas em conselhos em um total de 27 companhias. Dessas 34 vagas, atualmente 31 estão ocupadas, sendo que 19 por funcionários do banco e dois ministros.

O banco diz que Anielle Franco é reconhecida liderança da sociedade civil em questões de igualdade racial e de gênero, com dois mestrados, um no Brasil e outro no exterior, além de ser conselheira de organizações da sociedade civil.

O BNDES diz que a indicação avança no desafio da inclusão de mulheres e negros na alta administração de empresas em um cenário no qual apenas 19% das mulheres ocupam esse espaço e 3% são negros.

Sobre a indicação de Lupi, diz que o ministro tem destacada experiência administrativa no setor público e já ocupou cargos como presidente do Fundo de Amparo ao Trabalhador e presidente do Conselho Curador do FGTS, entre outros.

* Colaborou Eliane Oliveira


Fonte: O GLOBO