Polícia Civil de MG apura se houve erro médico ou possível homicídio culposo, quando não há intenção de matar. Hospital das Clínicas da UFMG também abriu procedimento para apurar o caso

Mais de uma semana depois de ser decapitado durante o parto, o corpo de Manuelle Vitória ainda não foi liberado do Instituto Médico-Legal André Roquette, em Belo Horizonte. 

O caso aconteceu em 30 de abril, no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), no bairro Santa Efigênia, na região Centro-Sul da capital mineira. O pai e a avó da criança, que acompanhavam o parto, afirmaram à polícia que chegaram a ver o rosto da criança, mexendo a boca e os olhos, mas depois notaram que a médica havia arrancado a cabeça dela durante o procedimento.

A mãe da criança, Ranielly Coelho, deu entrada na unidade de saúde em 24 de abril, com 30 semanas de gestação. A equipe médica constatou que a gestante estava com pressão alta, às 30 semanas de gestação, e decidiu interná-la. 

Em nota, o Hospital das Clínicas afirmou que o quadro de Ranielly piorou ao longo da semana e que a equipe de Medicina Fetal já tinha constatado "malformação pulmonar grave" do feto - um quadro "incompatível com a vida".

Considerando a gravidade do quadro da mãe e a "inviabilidade fetal", o hospital afirma que o corpo médico decidiu pela indução do parto. A advogada da família, Jennifer Valente, conta que o pai da criança entrou na sala de parto e avó materna acompanhou o procedimento através de um vidro.

— Até aí, estava tudo aparentemente normal. Até chamaram o pai para ver o bebê, disseram que a filha dele estava começando a nascer. O pai viu que a filha piscava, mexia com a boca. Só que, em determinado momento, o bebê não passava mais, no parto normal, e foi confirmado que houve falta de oxigenação. A médica pediu para cortarem a Ranielly com o bisturi e subiu em cima dela e fez força com a mão para retirar o bebê — conta a advogada.

Segundo a família, foi nesse momento que a criança teve a cabeça arrancada pela médica. A avó da menina contou à polícia que o sangue chegou a espirrar em outros profissionais. Parentes afirmam que constataram o fato ao verem uma sutura no pescoço do bebê.

— A médica tentou justificar que o neném tinha poucas chances de viver, mas a mãe alegou que, mesmo tendo malformação pulmonar, ele poderia nascer. Talvez pudesse falecer dias depois, mas não daquela forma. A médica depois pediu desculpas — diz Jennifer Valente.

Segundo a advogada, o hospital se prontificou a fazer o laudo de necropsia. Mas a família se recusou a assinar porque, de acordo com Jennifer, o documento citava "morte no útero". Ranielly e parentes então procuraram ajuda jurídica e foram até a delegacia registrar o caso.

Com o registro da ocorrência, o corpo foi levado para o IML. A Polícia Civil diz que não há prazo para a liberação do corpo do instituto porque o caso é de "grande complexidade e demanda estudos necroscópicos e laboratoriais detalhados". A liberação só vai ocorrer, de acordo com os investigadores, quando os médicos legistas definirem que não serão necessárias coletas adicionais de material para as análises.

A polícia apura se houve erro médico e possível homicídio culposo, quando não há intenção de matar. A advogada da família diz que também vai buscar a condenação do hospital por violência obstétrica e pedir uma indenização na Justiça.

Diante da acusação da família, o Hospital das Clínicas disse, em nota, que abriu um processo administrativo interno para apurar os fatos. A unidade ainda lamentou a morte do bebê.

"A equipe realizou todos os esforços para garantir a vida da gestante e está empenhado em esclarecer todos os fatos com transparência e agilidade", diz a nota do hospital, que não comenta os relatos da família sobre a decapitação.


Fonte: O GLOBO