A pedido de Lula, AGU foi ao STF contra limite a poder de voto do governo. Em comunicado, empresa afirma que processo contraria premissas que embasaram investimento de novos acionistas, inclusive de quem usou FGTS

As ações da Eletrobras caem mais de 3% nesta segunda-feira, após a Advocacia-Geral da União ter ajuizado ação no Supremo Tribunal Federal (STF) requerendo a declaração parcial de inconstitucionalidade da lei de privatização da Eletrobras. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um dos que assinam o processo. O objetivo da ação e rever o ponto da lei quer reduz o poder de voto do governo na gestão da empresa.

A Eletrobras divulgou fato relevante na manhã desta segunda-feira em que afirma ter tomado conhecimento da ação por meio de notícia publicada em site da AGU. Por volta de 10h25, as ações Eletrobras ON (ordinárias, com direito a voto) caíam 3,30% e Eletrobras PN (preferenciais, sem direito a voto) tinham queda de 3,19%.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) requer a declaração parcial de inconstitucionalidade de um artigo da lei que prevê a restrição de voto aos acionistas que, individual ou coletivamente, reúnam mais de 10% do capital votante da empresa.

A União tem diretamente 32,95% das ações ordinárias (com direito a voto da Eletrobras), além da fatia do BNDEs/BNDESPar, de 7,23%. Mas, pela lei da privatização, seus votos correspondem a um limite de 10%.

"O objetivo da ADI seria assegurar o direito da União de votar de forma proporcional à participação ora detida no capital votante da Companhia (...). Segundo a notícia, a finalidade da ADI não seria a reestatização da Eletrobras nem a alteração de seu regime jurídico vigente", diz a nota da Eletrobras.

"No entanto, caso deferido o pedido liminar e/ou julgada procedente a ADI pelo Supremo Tribunal Federal, a União e seu grupo potencialmente recuperariam a preponderância nas deliberações da assembleia geral, tendo em vista a participação detida por referido grupo nas ações ordinárias da Companhia em circulação", continua o comunicado.

Medidas para assegurar 'ambiente de investimentos'

Isso "contraria as premissas legais e econômicas que embasaram as decisões de investimento do mercado - inclusive os milhares de trabalhadores titulares de contas do FGTS -, a partir de modelagem desenvolvida pela própria União", diz o fato relevante.

No fato relevante divulgado hoje, a Eletrobras diz acreditar que "o processo de privatização foi conduzido em conformidade com a Lei n. 14.182 e a Constituição" e informa que "avaliará as medidas que eventualmente devam ser adotadas visando à manutenção de ambiente confiável para a realização de investimentos pela Eletrobras no país e a segurança jurídica de todos os seus acionistas e do mercado em geral".

Em entrevista à CNN no domingo, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse que vê o questionamento no STF com uma “preocupação muito forte”. No fim semana, Lula também falou sobre o processo na coroação de Charles III.

No comunicado, a Eletrobras frisa que o processo de desestatização da Eletrobras "seguiu fielmente todo o trâmite legalmente previsto, conduzido pelo BNDES e deliberado pelo Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos – CPPI".

Recorda ainda que a lei que viabilizou a privatização foi aprovada no Congresso Nacional e foi apreciada pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Na época, foram ajuizadas quatro outras ADIs questionando a mesma Lei nº 14.182/2021 e não houve "concessão de decisão liminar que de qualquer modo impactasse a consumação do processo de desestatização", diz a nota.

O limite de voto de 10%, independentemente da fatia do acionista na empresa, foi estabelecido na lei da privatização da Eletrobras e incluído no estatuto da companhia — privatizada em junho de 2022, em uma negociação pela qual investidores pagaram R$ 33,7 bilhões.

Companhia sem controle

Ao longo das negociações para a privatização, ficou claro que transformar a companhia numa corporation – ou seja, que não tem um controlador definido — seria uma das condições para atrair investidores e fazer o negócio deslanchar.

Outro ponto considerado relevante para atrair investidores foi a inclusão, no estatuto, de uma proteção contra a reestatização via poison pill, a pílula de veneno, no jargão do mercado. Por esse instrumento, caso queira reestatizar a empresa, o governo precisa pagar o triplo do valor das ações.

Em entrevista ao site Brasil 247, em março, Lula disse que a privatização da Eletrobras foi um crime de "lesa-pátria" e que o governo devia voltar a ser "dono" da companhia. Na época, já articulava questionar o modelo de privatização na Justiça.

Para a AGU, o limite de 10% fere os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade, da moralidade e da eficiência da administração pública, além de provocar grave lesão ao patrimônio e ao interesse públicos.

"A União, mesmo após a desestatização da Eletrobras, continua sendo a sua maior acionista, mas teve seus direitos políticos drasticamente reduzidos por medida injustificável do ponto de vista jurídico-constitucional", sustenta o governo na ação, assinada pelo próprio Lula e pelo chefe da AGU, ministro Jorge Messias.


Fonte: O GLOBO