Câmera de segurança do Palácio do Planalto mostra que um segundo homem jogou o objeto no chão e estilhaçou a raridade

O relógio do século XVII que ficava no terceiro andar do Palácio do Planalto foi jogado ao chão por um segundo golpista e não apenas pelo invasor identificado e preso pela Polícia Federal em Goiás, dias após a invasão do edifício em 8 de janeiro.

Imagens feitas por câmeras de segurança do Planalto mostram que um segundo golpista jogou o relógio histórico, feito pelo francês Balthazar Martinot, uma segunda vez ao chão, depois que outros dois invasores recolocaram a peça no móvel que havia sido derrubado inicialmente por Antônio Cláudio Alves Ferreira, de 30 anos.

O outro homem, que aparece no vídeo sem máscara, chapéu camuflado, camisa amarela da seleção brasileira, calça jeans e uma bandeira do Brasil como mochila, arremessa o objeto 40 minutos depois da primeira vez que a peça, que pertenceu a Dom João VI, foi derrubada. No segundo ato, a caixa de madeira do relógio se despedaça.

Primeira queda

Alves Ferreira aparece no corredor da ala Oeste do Planalto pouco depois das 15h30. Às 15h33 joga o relógio no chão. Em seguida, vai até o fundo do corredor, pega um extintor de incêndio e tenta destruir a câmera de segurança posicionada em frente ao móvel e às escadas que dão acesso ao quarto e ao segundo andar do Planalto. Ele não consegue destruí-la e então pega um outro extintor, que estava ao lado do relógio, e tenta, novamente, derrubar a câmera. Consegue apenas entortá-la.

Às 15h43, um homem de calça cinza, camisa amarela, mochila preta, pano azul escondendo parte do rosto e boné, pede ajuda a uma mulher no corredor para levantar o armário em que ficava o relógio do século XVII. Ela é loira, usa boné verde claro, camiseta da seleção brasileira e bandeira do Brasil amarrada à cintura, e aparece sem máscara.

Depois de levantar o móvel, os dois pegam o relógio e o põem de volta sobre o armário preto e dourado. Uma terceira mulher chega, confere se os ponteiros do relógio estão no lugar e tira uma foto da peça com o celular. Uma quarta mulher recolhe uma peça quebrada do relógio e a coloca ao lado da raridade.

A mulher loira ainda ajeita mesa e cadeira que haviam sido empurradas por Alves. Por volta das 15h52, um homem de roupa camuflada e chapéu (sem máscara) confere as horas em seu celular e ajusta os ponteiros da peça francesa para fazer uma foto registrando o horário da invasão com a “marca” da antiguidade.

Às 16h02, um homem de boné virado para trás, camisa da seleção e calça verde começa a forçar a boca do caixa eletrônico numa aparente tentativa de arrombar a máquina e tirar dinheiro dela. Permanece ali por um minuto.

Às 16h12, o segundo invasor que derrubou a peça passa pelo relógio, confere se há algo dentro do armário preto e, com a mão direita, joga o relógio ao chão.

Em seguida, mais um casal de golpistas se aproxima do relógio e o coloca de pé. Desta vez, apenas em frente ao armário. O homem está de máscara, camiseta azul da seleção e calça jeans. Já a mulher é loira, usa boné dourado e poncho cinza.

Às 16h13, um homem de camisa branca, que parece ser o major José Eduardo Natale Pereira, aparece apontando a escada para os seis golpistas no local e estabelece uma conversa com o grupo, que fica fora de enquadramento. Dois minutos depois, esse mesmo homem de camisa branca recebe cumprimentos de ao menos dois dos golpistas, que se dispersam em seguida.

Entre 16h14 e 16h15 dois invasores recolhem pedaços e estilhaços do relógio no chão e os colocam no armário enquanto outros golpistas conversam com o homem de camisa branca.

Às 16h17, outro homem com uma camiseta e mochila com estampas de camuflagem do Exército e boné se dirige à escrivaninha localizada no mesmo corredor do relógio, abre as gavetas e joga a papelada que ali estava no chão.

Bloqueio contra golpistas

Policiais militares só chegam a esse corredor, pelas escadas, às 16h27, vindos do terceiro andar. Ao menos 26 agentes aparecem nas imagens com escudos. Um deles dispara munição de efeito moral na direção dos golpistas.

Às 16h29, dois agentes usam uma escrivaninha para bloquear a escada vinda do segundo andar que dá acesso ao terceiro e, em seguida, saem de quadro.

O general Gonçalves Dias, então ministro do Gabinete de Segurança Institucional, aparece no corredor do relógio destruído por volta das 18h15. Ele está acompanhado de três homens. Um deles, de terno cinza e uma pasta, é Marco Aurélio Santana Ribeiro, chefe de gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ribeiro está visivelmente irritado com o que fizeram com a peça que decorava aquele corredor do Planalto.

Obra rara

O relógio destruído, de acordo com a Presidência da República, é uma obra rara e dele se conhece apenas mais um exemplar, exposto no Palácio de Versalhes, em Paris. O exemplar exposto em Versalhes, entretanto, possui a metade do tamanho da peça que foi completamente destruída pelos invasores do Planalto.

Em 2012, o relógio havia passado por uma restauração depois de ter sido resgatado de um depósito do governo federal. Quando a peça foi encontrada, havia uma fenda na parte superior e faltava a estátua de Netuno. Naquela altura, o objeto foi avaliado em cerca de R$ 250 mil. O governo federal, no entanto, publicou nota após a destruição pelos golpistas informando que "o valor desta peça é considerado fora de padrão".


Fonte: O GLOBO