O destaque serão os exercícios de tiro na província de Zambales, perto do Mar do Sul da China, onde tropas americanas e filipinas terão como alvo um navio desativado

Os Estados Unidos e as Filipinas iniciaram, nesta terça-feira, a maior versão de seu principal exercício militar em mais de 30 anos, uma demonstração de alto nível da aliança recentemente renovada que inclui treinamento com fogo real visando uma embarcação desativada perto do sul Mar da China. 

O exercício anual de Balikatan ocorre apenas um dia depois que a China concluiu seus próprios exercícios em Taiwan, e se concentra no desenvolvimento de segurança marítima, em um momento em que Manila e Washington estão tentando resistir à agressão chinesa na região.

A presença de mais de 17.600 soldados quase dobra o número do ano passado, de acordo com a Embaixada dos EUA em Manila.

—Os exercícios deste ano acontecem em outro momento decisivo no aprofundamento da aliança entre as Filipinas e os EUA — disse o chefe militar do país do Sudeste Asiático, o general Andres Centino, em uma cerimônia de abertura.

O destaque serão os exercícios de tiro na província de Zambales, perto do Mar do Sul da China, onde tropas americanas e filipinas terão como alvo um navio desativado para ensaiar um ataque marítimo, de acordo com o major-general Marvin Licudine, do Exército filipino.

Segundo ele, os exercícios visam aprimorar as capacidades defensivas das Filipinas e a conscientização sobre segurança marítima. Mais de 100 soldados da Austrália também participarão dos exercícios militares, e representantes de países aliados atuarão como observadores.

Os exercícios marcam o ápice dos esforços dos EUA para restaurar os laços com as Filipinas sob o governo do presidente Ferdinand Marcos Jr., cujo antecessor, Rodrigo Duterte, muitas vezes esnobou Washington em favor de Pequim. O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, e o secretário de Defesa, Lloyd Austin, se reunirão com seus colegas filipinos em Washington na terça-feira, buscando fortalecer a colaboração na região.

Os exercícios militares em Manila e o diálogo de alto nível em Washington mostram “a força e a importância da relação EUA-Filipinas”, disse Heather Variava, encarregada de negócios da Embaixada dos EUA em Manila durante a cerimônia.

Os exercícios acontecem na mesma semana em que a China realizou vários exercícios perto de Taiwan, dias depois que a presidente Tsai Ing-wen voltou de uma visita aos EUA, onde se encontrou com o presidente da Câmara, Kevin McCarthy, e outros legisladores americanos.

Em meio ao clima de tensão, um destróier dos EUA navegou em águas reivindicadas por Pequim, no Mar do Sul da China, na segunda-feira. A Sétima Frota da Marinha americana confirmou que seu contratorpedeiro USS Milius passou perto da Ilhas Spratly para “reafirmar sua liberdade de navegação”, a segunda manobra do tipo em menos de três semanas.

Apesar disso, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Wang Wenbin, afirmou que a cooperação militar entre os dois países “não deve interferir nas disputas no Mar do Sul da China” ou causar danos à “soberania territorial, direitos marítimos e interesses de segurança da China”.

Não se espera que os chamados exercícios de Balikatan, há muito tempo planejados, provoquem uma reação de Pequim, disse Carl Schuster, ex-diretor de operações do Centro de Inteligência Conjunta do Comando do Pacífico dos EUA.

— Aumentará as tensões, mas não em um grau perigoso ou incomum — ponderou, acrescentando que os exercícios são oficialmente direcionados para melhorar a capacidade de Manila de defender seus territórios ocidentais. — Pequim está mais focada em intimidar Taiwan e sinalizar aos EUA que não será fácil ajudar Taiwan em caso de conflito.

A reunificação de Taiwan é uma meta do governo chinês desde que os nacionalistas fugiram para a ilha ao serem derrotados na guerra civil, em 1949. Os americanos, por outro lado, embora tenham se comprometido com o princípio de "uma só China" — ou seja, de que o governo de Pequim é o único que verdadeiramente representa os chineses — ao reatar relações com Pequim há 44 anos, mantêm o apoio ao status atual da Taiwan autogovernada e fornecem ajuda militar à ilha.

'Circular e conter'

Manila prometeu buscar esforços de “defesa coletiva” com Washington em torno do Mar do Sul da China, em uma tentativa de conter um número recorde de incursões chinesas nas águas disputadas. Como parte da reaproximação, as Filipinas identificaram na semana passada quatro novos locais aos quais os EUA terão acesso, sob um acordo de defesa expandido — três deles perto de Taiwan.

Os novos locais elevarão o número de locais militares que os EUA podem acessar nas Filipinas para nove, incluindo cinco já existentes, sob o Acordo de Cooperação de Defesa Aprimorada, de 2014. O pacto permite que os EUA alternem suas tropas para estadias prolongadas, bem como construam e operem instalações nessas bases no país do Sudeste Asiático.

No entanto, em um sinal de como o novo presidente filipino tenta equilibrar os laços de seu país com Washington e Pequim — a China é o maior parceiro comercial das Filipinas — Ferdinand Marcos Jr. disse que os novos locais aos quais os EUA terão acesso não podem ser usados para operações ofensivas.

A China criticou a expansão, que sua embaixada em Manila descreveu como parte da tentativa dos Estados Unidos de “cercar e conter” a segunda maior economia do mundo.

Pequim reivindica direitos sobre mais de 80% do Mar do Sul da China— os outros reclamantes são as Filipinas, Taiwan, Malásia, Indonésia, Vietnã e Brunei. Apesar das tensões com a China, no entanto, esses países não vêm se alinhando com os EUA.

— A maior parte da região está no modo 'esperar, observar e ver' — disse Schuster. — Eles querem que os EUA inibam o comportamento da China, mas não confiam na disposição americana a longo prazo. Por isso, estão tentando manter boas relações com as duas potências.


Fonte: O GLOBO