'Nos abraçamos e choramos muito', diz Daniela da Silva, de 40 anos, sobre quando soube que filho estava vivo. Ele deveria estar tendo aula em colégio que não funcionou naquele dia

Daniela da Silva, de 40 anos, mãe do pequeno D., de 7, conta que, na manhã da última quarta-feira, havia acabado de chegar ao trabalho, em Blumenau (SC), quando recebeu uma ligação de vídeo inesperada de uma conhecida. A mulher estava preocupada e perguntava se D. estava na creche particular Cantinho Bom Pastor. 

Àquela altura, pouco se sabia sobre o que havia acontecido. Assim como uma das vítimas do ataque, a coleguinha dele Larissa Maia Toldo, da mesma idade, naquele horário o menino normalmente estaria estudando na Escola Aberto Stein, a poucos metros dali, antes de passar a tarde no infantário. Justamente naquele dia, no entanto, o colégio estava fechado e os pais anteciparam a ida.

A mãe conta que, em menos de 10 minutos, ela e o marido já estavam na estrada, sem sequer imaginar que havia mortos. Achava que tratava-se de um incêndio ou algo do tipo. Eles passaram todos os sinais fechados, buzinando e com o alerta ligado.

– No caminho, percebemos que outros dois motoristas faziam a mesma coisa. Chegando perto da creche, o trânsito estava completamente congestionado – narra.

Ela, então, desceu e foi andando, enquanto o marido procurava um lugar para estacionar.

– Quando soube que ele estava vivo, senti um misto de alegria em meio à dor da tragédia. Nós três nos abraçamos e choramos muito. Depois, tiramos o dia em família e evitamos ouvir notícias sobre o crime – conta.

O menino contou aos pais que estava no parque quando tudo aconteceu e que viu quando um amiguinho foi atacado. Ele disse que, logo em seguida, ouviu as professoras gritando que era um assalto e correndo com as crianças para dentro da creche.

– Ele disse que ficou junto com outras crianças na sala de vídeo, enquanto a professora segurava a porta. Todos estavam muito nervosos e esperando os pais – conta Daniela.

Ela conta que, para curar o trauma, não deverá voltar a levar o filho para a creche. Ela e o pai tentam se organizar para que consigam ficar com o menino no período da tarde, quando ele sai do colégio e eles ainda estão trabalhando.

– Quando passamos numa rua perto da creche, ele falou que não queria mais brincar no parque sem a presença da professora e dos coleguinhas e sem muro alto. Nós decidimos que, por enquanto, eu e o pai vamos nos revezar para cuidar dele, até que encontremos outro local. Gostamos muito da creche e não tenho nada a reclamar deles. Porém, não quero que ele fique traumatizado, sempre lembrando do que aconteceu – acrescenta.

Apoio gratuito de psicanalista

Daniela e toda a família estão recebendo atendimento gratuito da psicanalista e diretora da Sociedade Brasileira de Psicanálise Clínica (SBPC ), em Santa Catarina, Edina Esmeraldino. A psicanalista explica que crianças com mais de 5 anos precisam de uma conversa para entender o que elas absorveram e os pais devem transmitir segurança. Para as crianças menores de 5 anos, o caso deve ser tratado de forma mais lúdica. Verificar o que sabem e tentar explicar, mas sem entrar em muitos detalhes.

Porém, em ambos os casos, é necessário transmitir para os filhos segurança.

– Eles precisam continuar acreditando que os pais são os responsáveis pela segurança deles. Também não é bom demonstrar, na frente dos pequenos, a revolta normal que toda a comunidade está contra o autor do atentado – explica Edina.

Segundo a psicanalista, a maneira que os pais lidam com essa dor vai refletir no futuro dos seus filhos.

– Eles aprendem pelo exemplo. Demonstrar revolta na frente deles vai fazer entenderem e replicarem essa forma de comportamento quando forem adultos, ou seja, que o mal deve ser revidado com o mal. E se queremos uma sociedade mais justa, humana e amorosa, é isso que devemos ensinar aos nossos filhos. E deixar que a Justiça faça a sua parte – enfatiza.

Esclarecimento aos leitores sobre cobertura de ataques e massacres pelo Grupo Globo

A respeito do ataque ocorrido hoje a uma creche em Blumenau (SC), no qual quatro crianças foram mortas e outras cinco, feridas, o Grupo Globo divulgou nota sobre as diretrizes que orientam a cobertura de casos de ataques e massacres de seus veículos de imprensa:

"Os veículos do Grupo Globo tinham há anos como política publicar apenas uma única vez o nome e a foto de autores de massacres como o ocorrido em Blumenau. O objetivo sempre foi o de evitar dar fama aos assassinos para não inspirar autores de novos massacres. Essa política muda hoje e será ainda mais restritiva: o nome e a imagem de autores de ataques jamais serão publicados, assim como vídeos das ações.

A decisão segue as recomendações mais recentes dos mais prestigiados especialistas no tema, para quem dar visibilidade a agressores pode servir como um estímulo a novos ataques. Estudos mostram que os autores buscam exatamente esta "notoriedade" por pequena que seja. E também não noticiamos ataques frustrados subsequentes, também para conter o chamado "efeito contágio".


Fonte: O GLOBO